Artigo escrito pelo Prof. Msc. Bruno Seabra Mendonça Lima, da UNDB.

3 de Junho de 2018, depois de 26 horas de viagem, aterrissa o meu avião na Finlândia para uma imersão de 30 dias no sistema educacional e cultural desse país. O que me chama a atenção nos primeiros minutos é como as pessoas esperam pacientemente cada fileira de passageiro sair para poder levantar e pegar seus pertences, um primeiro contraste da realidade na maioria dos voos no Brasil.

Muitos devem estar se perguntando, mas porque Finlândia? Um país pouco conhecido da maioria, mas que é referência mundial na educação pelos seus resultados consistentes em exames internacionais como o PISA (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes). A Finlândia entrou no radar dos educadores mundiais por sua proposta inovadora de educação centrada no estudante, baseada por competências e não centrada em disciplinas e conteúdos.

No primeiro dia de aula ao passear pela pequena cidade de Tampere e adentrar a TAMk (Universidade de Ciências Aplicadas de Tampere) fica claro o primeiro e principal pilar da educação finlandesa: Confiança.

1 – Confiança

A confiança é reforçada com a primeira frase do professor: “Trust the process” – confie no processo, um pilar tão fundamental que as primeiras 8 horas de aula foi para ilustrar os lugares onde a confiança pode ser vista não só dentro do sistema educacional, mas sim da cultura finlandesa. Exemplos como: não existem cobradores, ou a exigência de um ticket para usufruir de transportes coletivos; celulares e computadores em mesas na faculdade sem o dono perto; bicicletas nas ruas sem trancas; caixas de supermercado onde o próprio cliente escaneia e paga suas compras, mas o exemplo que deveríamos pensar para nossa educação é ausência da figura de coordenador ou supervisor de aluno e professor.

No sistema educacional deles, existe uma base curricular nacional que fornece todas informações necessárias para os professores desenvolverem seu trabalho. A direção confia que o professor fará seu trabalho, o professor confia que o aluno irá cumprir sua parte e os pais e a sociedade confiam que a escola irá realizar o seu objetivo de formar o aluno segunda as diretrizes nacionais, esse ciclo de confiança é o primeiro e principal pilar.

Voltando do primeiro dia de aula e refletindo sobre as palavras ditas mais cedo pelo professor Juha Lahtinen, às 16h da tarde me deparo com as ruas cheias de crianças voltando da escola, muitos carros nas ruas, paradas e ônibus lotados, e os supermercados cheios de famílias comprando. Perguntei para uma pessoa no ônibus e ele diz, escola e trabalho terminam até 17h da tarde no máximo, e então consegui entender uma frase que Juha nos disse: “Less is more” – menos é mais.

2 – Less is more (Menos é mais)

A nossa cultura de estudos e trabalho de resultado é: quanto mais, melhor. Será essa uma verdade? Ou poderíamos aprender um pouco mais sobre esse pilar da cultura finlandesa?

O inicio da escola na Finlândia é aos 7 anos, isso mesmo, até os 6 anos as crianças só têm uma preocupação: brincar. Mesmo ao chegar na escola, a carga horária de disciplinas é quase metade de uma escola regular no Brasil, começando às 9h da manhã e com intervalos de 30 minutos a cada 1h30m de aula. Dever de casa? Em raras oportunidades. Porque? A educação na Finlândia é toda baseada em estudos científicos conduzidos pelas próprias universidades pedagógicas finlandesas, nenhuma das quais conseguiu provar que mais aulas, palestras e exercícios contribuem para um maior aprendizado.

Eles conseguiram provar e acreditam que aprendizado não é e nem deve estar somente em sala de aula, e sim em qualquer ambiente e horário. O tempo em sala com o professor deve ser produtivo, efetivo e destinado a aprendizagem significativa e não gasto com monólogos exauridos que deixam qualquer aluno entediado.

Ao longo do curso fui percebendo como todo trabalho era feito por nós mesmos, os estudantes, eram raros os momentos em que qualquer professor espalhava e despejava conteúdo. Ficou nítido para mim como eles conseguiam aprendizagem significativa: Estudante no centro do processo.

3 – Estudante no centro do processo

O que será mais produtivo: Um desenvolvimento de um trabalho coletivo sobre uma problemática proposta pelo próprio aluno ou uma palestra do professor para os alunos? O famoso aprender fazendo é o pilar pedagógico fundamental na educação finlandesa, ao contrário do que temos na maioria das escolas brasileiras, o também famoso Spray and Pray (Espirre e Reze), espalhe conteúdo oralmente e reze para que todos alunos tenham entendido.

Como aprender fazendo? Como colocar o estudante no centro do processo? Dentro do curso, explorei bastante o universo pouco conhecido de métodos ativos de aprendizagem. Esse mundo que já tinha contato, mas não sabia que se tornaria um universo de opções: GV-GO, Fishbowl, PIGS Face, Peer Instruction, Phenomenon Based Learn, Project Based Learning, Problem Based Learning, WAC, World Café, Learning Tournament, Active Debate, entre várias outras based learning.

A imersão nesse universo foi conduzida utilizando as próprias metodologias de aprendizado, consegui prova da visão do estudante o quanto você, estudante, fica responsável pela construção do seu conhecimento, e as metodologias e professores são somente um plano e um guia de como você irá percorrer esse caminho do aprendizado. A capacitação nesse formato também é utilizado nas universidades de pedagogia da Finlândia e me fez enxergar outro pilar desse sistema: Formação de professores.

4 – Formação de professores

Um processo de formação e capacitação de professor em que o próprio professor finlandês teve que desenhar a Figura abaixo, e explicar por mais de 15 minutos e mais de uma vez, já deixa claro o grau de exigência e competência exigidas dos professores na educação da Finlândia.

A exigência mínima para dar aula na educação básica é ter um mestrado em pedagogia aplicada, isso é depois de já ter passado pela faculdade de pedagogia e uma especialização (Teacher training – treinamento de professor), ou seja, para dar aula em qualquer segmento da educação na Finlândia você antes tem de estudar 8 anos, o mesmo tempo de um médico, que é outra profissão de grande valorização social na Finlândia.

Além do grau de competência do professor é notável o apreço desse profissional dentro da sociedade, podendo ser comprovada pelo número de aplicações para as universidades, onde cerca de 30% dos melhores alunos aplicam para universidades de pedagogia na Finlândia. Qual será o número no Brasil? Claro que não só de valorização vive o professor na Finlândia, mas o salário também é um dos melhores dentre as profissões, existe pouca diferença entre a remuneração de um professor e um médico, por exemplo. Aliás, isso me leva ao último pilar cultural e base educacional finlandesa: Igualdade.

5 – Igualdade

Como disse outra professora do curso, Sisko Mällinen, igualdade não é dar ou prover a mesma coisa para todas as pessoas, mas sim ser justo com todos em cada situação. Além de ser proibido por lei educação privada na Finlândia, em todos os níveis, a qualidade da educação é garantida pela base curricular nacional que é respeitada na base da confiança por todas as escolas. Como se já não bastasse ser de graça e de qualidade, mas todos os estudantes que adentram as universidades recebem uma bolsa de auxílio para estudar, para que não tenham preocupações a não ser o seu desenvolvimento como profissional.

A igualdade no nível finlandês é tão incrível, que as escolas são obrigadas por lei a ofertar aulas de língua natal e cultural para os imigrantes, seja o estudante russo, alemão ou brasileiro terá aulas de cultura e língua em russo, alemão e português, além das já obrigatórias: finlandês, sueco e inglês. Outra mostra do nível igualitário da educação é a quantidade enorme de graduados e mestres em trabalhos como atendente de supermercado, vendedores de loja e motoristas de transporte público.

Claro que a igualdade não fica somente na educação, mas na remuneração também, a diferença salarial entre o mínimo e os maiores salários é pequena, e o salário mínimo finlandês gira na casa dos EUR$1.800 (euros), algo em torno de R$8.500 (reais), o que realmente dá a possibilidade de uma vida financeiramente estável para toda população.

Quando me perguntam, como foi na Finlândia, eu sempre respondo: Intenso. Não existe outra palavra para resumir, muito conhecimento adquirido, muita experiência cultural na bagagem e muito trabalho pela frente para trazer o melhor do sistema finlandês para o grupo Dom Bosco.

Para finalizar gostaria de deixar uma frase que trouxe comigo para o Brasil: “Dê o seu melhor, e nunca será suficiente. Dê o seu melhor mesmo assim!” – Mother Teresa.